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sábado, 3 de julho de 2010

Comentário sobre Aguilar

Flanando pela cidade, deparei-me com Aguilar.

A exposição fazia um retrato cronológico da obra do artista, mostrando quadros, intervanções, performances e vídeos que remontam dos anos sessenta e chegam até hoje, neste estranho ano de 2010. O que lá vi foi a maturação de um artista plástico, a permanência de alguns temas, a renovação de técnicas, e uma sequências de belas produções, como o quadro Sampa, retrato da cidade natal do pintor, ou as homenagens aos duzentos anos de revolução francesa. Apesar dos meus conhecimentos infantis sobre artes plásticas, acompanhei o desfilar de obras, li os textos e tive uma ótima experiência naquela uma hora dentro do CCBB.

Acima de tudo, impressionei-me com uma das instalações, de título inspirador e de beleza sem igual: a criação do tempo e do mundo. É uma obra que nos obrigar a usar antíteses para descrevê-la: clara e escura, reta e torta, sólida e diáfana, imóvel e movimentada. Tal alternância de impressões gera um paradoxo cuja aridez resulta numa composição linda: um palco áspero onde repousam formas envidraçadas de bordas curvas, dentro das quais estão pedras de carvão. No plano de fundo, uma tela branca apresenta grossas linhas escuras (rastros de carbono?) que misturam linhas retas e formas mais abauladas. Tudo isso é iluminado por uma lâmpada amarelada pendurada do teto (o fio elétrico é torto e direito ao mesmo tempo) até bem perto do palco, gerando sombras surrealistas que nascem do vidro e grudam no ambiente arenoso do chão. Ainda por cima, como presente aos mais atentos, essa mesma lâmpada ilumina as pessoas em frente à instalação e suas sombras escuras se projetam na parede branca da sala de exposição, obrigando-nos a nos virar para vermos projetado.

A intromissão repentina do público na obra faz com que nos indentifiquemos com o receptáculo vítreo dentro do qual há um pedaço negro de carvão. O artista genialmente joga na cara de todos nós nossas próprias contradições, nossa arrogância em exigir coerência dos outros e do mundo, este também feito de sombras e formas diáfanas. A instalação, que aparentemente é escanteada para um pequeno palco, na verdade usa a luz para se distanciar de seu ponto de gravidade, alcançando a todos os que param em sua frente. É, portanto, uma experiência global, como somente as sensibilidades mais aguçadas podem criar.

Conclusão precipitada? Pode ser, ainda mais se se admitir que o título da obra serve apenas para abrir o nosso apetite, não para nos conduzir pela obra toda. Foi isso que eu senti, entretanto.

Para quem quiser, site do artista.

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